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segunda-feira, 25 de novembro de 2024

Hidrogênio Verde: desafios e oportunidades na transição energética sustentável

Entrevista com Fernanda Delgado, da ABIHV, destaca o papel crucial e os obstáculos a superar para a adoção em larga escala.

Redação

A busca por alternativas energéticas limpas e sustentáveis tem impulsionado o debate em torno do hidrogênio verde como uma solução promissora para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, podendo oferecer oportunidades para avançar em direção a uma matriz energética mais sustentável e ecológica.

Nesse contexto, a ABIHV (Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde) surge como uma coalizão de empresas líderes nos setores de energia, tecnologia e agro, unidas pela visão de impulsionar o hidrogênio verde como solução para a neoindustrialização e sustentabilidade econômica e ambiental do Brasil. Além de contribuir para a descarbonização da economia global, a associação busca liderar o país nesse setor emergente e estratégico, desempenhando um papel unificado e representativo.

Hidrogênio Verde: desafios e oportunidades na transição energética sustentável
Fernanda Delgado, diretora-executiva da ABIHV (Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde) – Foto: Divulgação

Nesta entrevista concedida ao Jornal A Gazeta, a diretora-executiva da ABIHV, Fernanda Delgado, compartilhou insights sobre o papel promissor do hidrogênio verde na redução das emissões de gases de efeito estufa, o atual cenário das políticas públicas brasileiras, o mercado de créditos de carbono e as perspectivas futuras. Além disso, ela abordou o papel que a ABIHV desempenha no avanço desse setor estratégico em nosso país.

No entanto, embora o hidrogênio verde tenha potencial, Fernanda ressalta desafios a serem superados para sua adoção em larga escala. Aspectos notórios, como a viabilidade econômica, a infraestrutura necessária para produção e distribuição e a disponibilidade de tecnologias adequadas, demandam uma abordagem abrangente. Nesse sentido, ela destaca a importância de um compromisso global e políticas coordenadas para impulsionar o desenvolvimento e garantir a sua plena integração na matriz energética mundial.

Confira a entrevista na íntegra:

A GAZETA: Como o hidrogênio verde pode contribuir para a redução das emissões de gases de efeito estufa?

FERNANDA DELGADO: O hidrogênio verde pode contribuir muito para reduzir as emissões de carbono porque é confeccionado com energéticos renováveis, como energia solar e energia eólica. A eletrólise, processo que separa o hidrogênio do oxigênio da água, evita a emissão direta de CO2 associada a métodos tradicionais de produção de hidrogênio. Por isso, o uso de hidrogênio verde no lugar do hidrogênio cinza, ou do óleo combustível ou do carvão, seja como carburante ou como matéria prima no processo produtivo, contribui para a neutralização de emissões líquidas de carbono, posicionando a produção de hidrogênio verde como componente-chave na transição para uma economia de baixo carbono.

Quanto às preocupações ambientais associadas à sua produção, como todo processo produtivo, há impactos gerados, sendo um deles a necessidade de metais raros para a fabricação de eletrolisadores de membrana de troca de prótons (PEM). Outro aspecto é a dependência de eletricidade proveniente de fontes renováveis para alimentar os eletrolisadores, o que implica em desafios relacionados à variabilidade na oferta de energia. A produção intermitente dessas fontes pode criar discrepâncias na produção de hidrogênio verde, demandando soluções de armazenamento de energia ou sistemas de backup. No entanto, de acordo com todos os estudos nacionais e internacionais já realizados, os benefícios para o meio ambiente são incomparavelmente maiores.

A GAZETA: Quais são os desafios e obstáculos atuais na produção e implementação do hidrogênio verde? E quais são as políticas atuais do Brasil em relação a ele e ao mercado de créditos de carbono?

FERNANDA DELGADO: Neste momento, o desafio maior na implementação do Hidrogênio Verde está sendo justamente o da regulamentação do setor. No final do ano passado, foi aprovada no Parlamento brasileiro a primeira versão do Projeto de Lei que regulamenta a cadeia produtiva do Hidrogênio Verde (PL 2308/2023). Atualmente, em tramitação no Senado. Este é um passo muito importante na construção de um marco regulatório para o desenvolvimento do Hidrogênio no país. Isso abre caminho para se estabelecer o Hidrogênio como vetor energético, coloca o Brasil no processo para estabelecer essa economia de baixo carbono e a neoindustrialização verde, com essa questão de trazer a indústria verde dos processos produtivos. Essa construção de um arcabouço legal viabiliza a competitividade do Hidrogênio Verde no país, é o primeiro passo para o país ser líder da descarbonização, para trazer projetos para o Brasil, projetos sólidos, sustentáveis, de ordem nacional e internacional. Porém, ainda existem avanços significativos que podem ser feitos nessa etapa final de tramitação, para mecanismos que estimulem o desenvolvimento da indústria, como incentivos regulatórios e financeiros, para deixar o Hidrogênio mais competitivo. É importante mencionar que outras formas de energia tiveram também um apoio, um estímulo, creditício, financeiro, tributário, no início do adensamento das suas cadeias produtivas. Promover essa demanda, promover a competitividade é justo e pertinente para um amadurecimento tecnológico e um estímulo da cadeia produtiva do hidrogênio verde.

Em relação ao mercado de créditos de carbono, o Brasil possui um marco regulatório para o mercado de créditos de carbono desde 2009, com a criação da Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC) e do Sistema Nacional de Mudança do Clima (SISNAMA). Essas políticas estabelecem diretrizes importantes para a ação do governo federal na mitigação das mudanças climáticas, incluindo o desenvolvimento do mercado de créditos de carbono.

Além disso, o país conta com o Programa Nacional de Redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa (PNRE), que define metas de redução de emissões de GEE e utiliza o mercado de créditos de carbono como um dos instrumentos para alcançar tais metas. Outra iniciativa relevante é a Política Nacional de Combate ao Desmatamento Ilegal na Amazônia Legal (PPCDAm), que busca reduzir o desmatamento na região e pode recorrer ao mercado de créditos de carbono para financiar projetos que contribuam para esse objetivo.

A GAZETA: Como o mercado de créditos de carbono funciona e qual é a sua importância para a sustentabilidade?

FERNANDA DELGADO: O mercado de créditos de carbono é um sistema que permite que empresas e países compensem suas emissões de gases do efeito estufa (GEE). Funciona de tal maneira que empresas e países que emitem mais GEE do que o permitido por suas metas podem comprar créditos de carbono de empresas ou países que emitem menos. Cada crédito de carbono equivale a uma tonelada de CO2 ou outro gás equivalente não emitido na atmosfera. Esses créditos podem ser gerados por diversos projetos que reduzem as emissões de GEE, como projetos de reflorestamento, energia renovável e eficiência energética.

A importância do mercado de créditos de carbono para a sustentabilidade é que, em primeiro lugar, ele incentiva a redução das emissões de GEE, pois ao comprar créditos, as empresas e países assumem a responsabilidade por suas emissões e são motivados a buscar formas de reduzi-las. Além disso, o recurso gerado com a venda de créditos de carbono pode financiar projetos que reduzem as emissões de GEE, contribuindo assim para a mitigação das mudanças climáticas. Por fim, o mercado de créditos de carbono pode promover o desenvolvimento sustentável ao estimular a criação de novas tecnologias e investimentos em projetos verdes.

A GAZETA: Como a integração do hidrogênio verde ao mercado de créditos de carbono pode impulsionar a descarbonização da economia?

FERNANDA DELGADO: A produção de Hidrogênio Verde, por si só, já é um passo significativo na luta contra às mudanças climáticas. Ao substituir combustíveis fósseis em diversos setores da economia, como transporte, indústria e geração de energia, este energético pode reduzir drasticamente as emissões de gases de efeito estufa. Nessa integração entre setores produtivos, há vantagens para o Hidrogênio Verde, pois a geração de créditos de carbono torna este vetor energético mais competitivo em relação aos combustíveis fósseis, acelerando sua adoção em larga escala. Por outro lado, para o mercado de carbono, o Hidrogênio Verde fornece uma fonte confiável e verificável de reduções de emissões, aumentando a credibilidade e a eficiência do sistema.

A GAZETA: Quais são as perspectivas futuras para o hidrogênio verde e o mercado de créditos de carbono no Brasil e no mundo?

FERNANDA DELGADO: Segundo os estudos da Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde, enxergamos que a partir da tomada de decisão de 2024, que podem começar a sair do papel os atuais projetos atualmente em discussão no país, para o uso de 180 Megawatts de eletrolisadores, e a previsão de R$ 7 trilhões de impactos diretos, indiretos e afetos ao PIB nacional. Sem mencionar a arrecadação para todas as esferas do governo até 2050. Se formos pensar em tudo o que esse montante pode reverberar na economia, isso significa também um superávit primário de R$ 72 bilhões, a partir de 2027. Esses são os números iniciais de um estudo contratado pela ABIHV. De acordo com estimativas de órgãos internacionais, o mercado global de hidrogênio verde pode chegar a US$ 1,4 trilhão até 2050 (no câmbio de hoje, cerca de R$ 7,44 trilhões). Esse montante representa um crescimento de mais de 10.000% em relação ao mercado atual, que é estimado em cerca de US$ 14 bilhões.

A GAZETA: Quais são as oportunidades de investimento e parceria no setor de hidrogênio verde para empresas e governos interessados ​​em promover a transição energética sustentável? E quais são os principais mercados e setores que demonstram interesse e o adotam como parte de suas estratégias de sustentabilidade?

FERNANDA DELGADO: A maioria dos 57 projetos em estudo para implantação no Brasil são de iniciativa internacional. Companhias da Europa, da Ásia e da Austrália têm realizado diversos estudos a respeito da potencialidade do Brasil na produção do hidrogênio verde. Todos são unânimes em afirmar que o país é um dos que possui a maior capacidade de produzir hidrogênio verde de forma sustentável e com retorno comercialmente viável, em comparação com outros locais do planeta. Entretanto, apenas condições favoráveis não são suficientes para colocar uma indústria de pé. Ainda falta estímulo governamental. Ainda falta o arcabouço legal, que permitiram as tomadas de decisão.

Entre as principais parcerias internacionais podem ser destacadas a Aliança Brasil-Alemanha para o Hidrogênio Verde, criada em 2020 para promover a cooperação entre os dois países no desenvolvimento do hidrogênio verde, incluindo empresas, instituições de pesquisa; e o Memorando de Entendimento entre o Brasil e a União Europeia para a Cooperação no Setor do Hidrogênio, assinado em maio de 2022, para promover a cooperação entre os dois blocos no desenvolvimento do hidrogênio verde, contemplando áreas como pesquisa e desenvolvimento, produção, armazenamento e transporte deste vetor energético. Além disso, o Brasil participa de iniciativas internacionais, a exemplo da Hydrogen Council, organização global que reúne empresas, governos e organizações de pesquisa para promover o desenvolvimento do hidrogênio verde. Essas parcerias internacionais são importantes para o desenvolvimento do hidrogênio verde no Brasil, pois permitem o acesso a tecnologias, financiamento e conhecimento.

A GAZETA: Como a ABIHV está contribuindo para o avanço do hidrogênio verde?

FERNANDA DELGADO: A Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde (ABIHV) reúne as principais empresas participantes da cadeia produtiva do Hidrogênio Verde no Brasil, e com atuação neste mesmo setor em outros países. Por isso, a instituição possui um papel fundamental no avanço do Hidrogênio Verde no Brasil por meio de diversas iniciativas. A ABIHV atua como representante do setor do Hidrogênio Verde em fóruns e eventos nacionais e internacionais, defendendo os interesses da indústria e promovendo o diálogo entre os diferentes stakeholders. Além disso, incentiva a pesquisa e desenvolvimento de tecnologias relacionadas ao Hidrogênio Verde, realizando workshops, seminários e publicando estudos e relatórios. A ABIHV também se dedica à divulgação dos benefícios do Hidrogênio Verde para a sociedade e o meio ambiente, por meio de campanhas de marketing, materiais informativos e eventos.

Dentre os exemplos concretos de atuação da ABIHV, destaca-se sua participação na elaboração do Marco Legal do Hidrogênio Verde, contribuindo para o projeto de lei que institui tal marco no Brasil. Além disso, a ABIHV participa regularmente eventos para promover o debate sobre o Hidrogênio Verde, e publica estudos e relatórios sobre o potencial do Hidrogênio Verde no país.

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