O número de empresas que entraram em recuperação judicial em Mato Grosso do Sul mais que dobrou no período de um ano. De acordo com dados da Serasa Experian, o total passou de 6 recuperações judiciais concedidas no Estado, no período de janeiro a outubro de 2022, para 14, no mesmo período deste ano – aumento identificado de 133,32%.
O levantamento aponta ainda que a quantidade de pedidos requisitados também apresentou elevação significativa, nos 10 primeiros meses do ano passado foram 6 recuperações requeridas, enquanto neste ano foram 18 requisições.
Houve um aumento porcentual de 41,67% de recuperações judiciais deferidas em Mato Grosso do Sul entre 2022 e este ano. Enquanto no ano passado foram 12 deferimentos, neste ano foram 17 até outubro.
Advogado especializado em reestruturação e recuperação judicial, Carlos Henrique Santana aponta que existe um cenário complexo. “De fato, o número é alarmante e ainda é um reflexo da pandemia para alguns setores, mas, sem dúvida, a alta taxa de juros continua sendo um dos principais motivos para o aumento no número de pedidos”, aponta.
O mestre em Economia Lucas Mikael destaca que o momento atual é uma consequência do processo de aumento de inadimplência que começou em setembro de 2021 e bateu pico histórico no primeiro semestre deste ano.
“Uma verdadeira tempestade, que inclui altas taxas de juros, pressão inflacionária e baixo fluxo de caixa nas empresas, motivada pelo período recente de crise econômica”, afirma.
O economista Márcio Coutinho atribui a situação à economia como um todo. “Ainda não está devidamente aquecida, ainda precisa melhorar a renda do trabalhador para que ele volte a consumir. A população em geral precisa estar menos endividada, e, consequentemente, isso vai aquecer o mercado”, pondera.
No âmbito nacional, as Americanas, o Starbucks, a Marisa e a M.Officer são algumas das que integram a longa lista de empresas que entraram com pedido de recuperação judicial este ano. Entre janeiro e outubro, segundo a Serasa Experian, 1.128 companhias no País pediram proteção contra credores – o número já supera todos os 833 pedidos registrados no ano passado.
O varejo é o setor com o maior número de recuperações judiciais, tanto no panorama estadual quanto nacional.
COMÉRCIO
Marcio Coutinho detalha que Mato Grosso do Sul segue a tendência, que é um “fenômeno nacional”.
“Os empresários estão praticamente sem capacidade de honrar seus compromissos, muitas empresas passaram a tentar ou renegociar seus compromissos ou rolar a dívida [trocar um crédito velho por um novo]. Quem conseguiu, se viu preso a um cenário em que o elevado nível de juros acabou agravando ainda mais o endividamento”, avalia o economista.
Sobre o varejo em Mato Grosso do Sul, Coutinho salienta que o setor é um dos mais afetados, em razão da margem de lucro mais flexível adotada. “Se a margem de lucro dele é apertada e ele tem um aumento nesses custos referentes principalmente à parte financeira, custo de despesas financeiras, isso vai corroendo o resultado dele”, explica.
O economista detalha que o principal fator é o aumento da taxa de juros, que saiu de 2% ao ano em 2020 e manteve-se a 13,75% de agosto de 2022 a agosto deste ano, quando começou a cair .
RECUPERAÇÃO JUDICIAL
O advogado Carlos Henrique Santana esclarece que a recuperação judicial é um instrumento previsto na Lei nº 11.101/2005, que estabelece normas e procedimentos para a recuperação de empresas em situação financeira delicada, visando à reabilitação econômica.
“O principal objetivo da recuperação judicial é permitir que a empresa em dificuldades financeiras possa reorganizar sua atividade, superar a crise econômico-financeira e manter as operações, evitando a falência”.
Ele ainda pontua que o pedido de recuperação judicial é feito no Poder Judiciário e deve ser acompanhado de documentação específica.
“Após analisar a documentação, o juiz indica uma perícia prévia, para avaliação preliminar de condições e premissas sobre as condições da empresa, e decide pela concessão ou não da recuperação judicial. Se concedida, será nomeado um administrador judicial e a empresa terá um prazo para apresentar o plano de recuperação, com as características e condições de pagamento das dívidas”, elenca.
Sobre o plano de recuperação, o advogado salienta que é um documento que apresenta as medidas que a empresa pretende adotar para superar a crise financeira. Esse plano deve ser submetido à aprovação dos credores e do juiz. Se aprovado, a empresa tem a chance de implementar as medidas propostas.
Santana lista alguns dos fatores que podem levar uma empresa a ingressar com uma ação de recuperação judicial quando enfrenta uma situação financeira insustentável e não consegue honrar seus compromissos financeiros.
“Endividamento excessivo, crise econômica ou setorial, problemas operacionais ou de gestão, falta de capital de giro, eventos inesperados, conjuntura jurídica e, especialmente, quando ocorre a incapacidade de negociar acordos extrajudiciais”, finaliza o advogado.